Este blog foi produzido com as constribuições dos alunos das turmas de 1ª serie do prof Aurelio Fernandes.

João Calvino (10/07/1509 - 27/05/1564)

João Calvino fundou o Calvinismo, uma forma de Protestantismo cristão, durante a Reforma Protestante. Esta variante do Protestantismo seria bem sucedida em países como a Suíça (país de origem), Países Baixos, África do Sul (entre os Afrikaners), Inglaterra, Escócia e EUA. Nasceu em Noyon, Picardia, França, com o nome de Jean Cauvin. A transposição do nome "Cauvin" para o Latim (Calvinus) deu a origem ao nome "Calvin" pelo qual ele é conhecido. Calvino foi inicialmente um humanista. Nunca foi ordenado sacerdote. Depois do seu afastamento da Igreja católica, este intelectual começou a ser visto, gradualmente, como a voz do movimento protestante, orando em igrejas e acabando por ser reconhecido por muitos como "padre". Vítima das perseguições aos protestantes na França, fugiu para Genebra em 1536, onde faleceu em 1564. Genebra tornou-se definitivamente num centro do protestantismo Europeu e João Calvino permanece até hoje uma figura central da história da cidade e da Suíça. Martinho Lutero escreveu as suas 95 teses em 1517, quando Calvino tinha 8 anos de idade. Para muitos, Calvino terá sido para a língua francesa aquilo que Lutero foi para a língua alemã - uma figura quase paternal. Lutero era dotado de uma retórica mais directa, por vezes grosseira, enquanto que Calvino tinha um estilo de pensamento mais refinado e geométrico, quase de filigrana. Citando Bernard Cottret, biógrafo (francês) de Calvino: "Quando se observa estes dois homens podia-se dizer que cada um deles se insere já num imaginário nacional: Lutero o defensor das liberdades germânicas, o qual se dirige com palavras arrojadas aos senhores feudais da nação alemã; Calvino, o filósofo pré-cartesiano, percursor da língua francesa, de uma severidade clássica, que se identifica pela clareza do estilo".

Nyon

O avô de João Calvino trabalhava numa cantina em Point-l'Évêque, nas proximidades de Noyon. Teve três filhos: Richard, que foi serralheiro e se instalou em Paris, Jacques, igualmente serralheiro e, finalmente, Girard Cauvin, pai de João Calvino, que foi aquele que talvez mais se destacou dos três, tendo feito carreira em Nyon como funcionário administrativo. Girard Cauvin estabeleceu-se em Noyon em 1481. Foi inicialmente um simples secretário da chancelaria. Seria, depois, advogado representante do bispado de Nyon; mais tarde, funcionário relacionado com a cobrança de impostos e, finalmente, o promotor (representante) do bispado, antes de entrar em conflito com este. Faleceu em 1531 após uma disputa com o bispado, pela qual foi excomungado. A autorização para o seu funeral seria deveras dificultada devido a esta querela. A mãe de Calvino, Jeanne Le Franc, de seu nome de solteira, era filha de um dono
de uma hospedaria em Cambrai, que tinha enriquecido. Jeanne faleceu em 1515, quando João Calvino tinha apenas 6 anos de idade.

Girard e Jeanne tiveram quatro filhos:

Charles, o mais velho, foi padre. Faleceu em 1536.
João Calvino. Antoine - Iria mais tarde viver em Genebra, junto do irmão.
François - Morreu ainda em tenra idade.

Haveria ainda duas irmãs, que nasceram do segundo casamento de Girard. Uma chamou-se Maria e iria também viver em Genebra. Da outra irmã sabe-se pouco. João Calvino nasce a 10 de julho de 1509, nos últimos anos do reinado de Luís XII. Freqüentou inicialmente o "Collège des Capettes" em Nyon, onde adquiriu conhecimentos básicos de latim. Em 1 de Janeiro de 1515 o rei Francisco I de França (François, roi des françois), sucedeu a Luís XII. Inicialmente moderado em matéria de religião, a postura deste rei foi endurecendo ao longo do seu reinado, terminando na perseguição declarada dos protestantes. Pela Concordata de Bolonha, assinada no início do seu reinado, o papa Leão X concedia ao rei da França o direito a nomear os titulares dos rendimentos da igreja. Em contrapartida, o Papa via reforçados os seus direitos sobre a Igreja em França.

Em 1529, pouco antes de atingir os vinte anos de idade, a vida de Calvino sofreu uma súbita viragem. Tendo vindo inicialmente para Paris com uma renda anual concedida pela Igreja, com o fim de estudar Teologia, ficará a saber que o pai mudou de planos em relação ao seu futuro e quer que ele siga Direito. A "ciência das leis torna normalmente ricos aqueles que se debatem com ela", referia o seu pai (ele próprio um advogado do bispado), segundo as próprias palavras de Calvino. Cumpriu a vontade do pai e foi estudar Direito para Orleães, mas nunca deixou de preferir a teologia. Como disse mais tarde: "Se Deus me deu forças para que eu cumprisse a vontade de meu pai, determinou ele pela providência oculta que eu tomasse finalmente um outro caminho" (o da Teologia). Inicialmente Calvino preparava-se para ser padre, enveredaria pelo estudo do direito, mas Deus trouxe-o de novo ao caminho da Teologia.
Em Orleães, Calvino foi influenciado pelo seu professor Pierre de l'Estoile. Em 1529, dirige-se também a Bourges, para assistir a aulas do famoso professor de direito italiano Andrea Alciati, onde também assiste a aulas do alemão Gräzist
Wolmar, que o entusiasmou pela literatura grega da antiguidade. Em 1529, Louis de Berquin foi queimado vivo em Paris, numa altura em que o rei, Francisco, estava fora da cidade.
Em 1531, Calvino, num prefácio ao livro de um amigo, toma partido pelo seu professor Pierre de l'Estoile num texto que explora a disputa entre este e Andrea Alciati, talvez por lealdade e nacionalismo. O que prova que o Calvino de
1531 ainda não é um reformador mas, acima de tudo, um humanista. Neste mesmo ano morre o pai, Gerard Cauvin. Calvino vai a Bourges, a Orleães e regressa de novo a Paris, onde se instala em Chaillot.

Até 1532 não há, como se viu, qualquer indício de que Calvino tenha aderido à nova fé - nos seus diferentes focos e graus que surgem pela Europa - onde o Luteranismo surge como um movimento mais moderado e os anabaptistas como uma força mais radical.
A conversão de Calvino ao protestantismo permanece envolta em mistério. Sabe-se apenas que ela se deu entre 1532 e 1533 (Calvino tem 23 ou 24 anos). Um texto escrito por Calvino em 1557 como prefácio ao seu comentário sobre os salmos oferece-nos alguns parcos pormenores: "Após tomar conhecimento da verdadeira fé e de lhe ter tomado o gosto, apossou-se de mim um tal zelo e vontade de avançar mais profundamente, de tal modo que apesar de eu não ter prescindido dos outros estudos, passei a ocupar-me menos com eles. Fiquei estupefato, quando antes mesmo do fim do ano, todos aqueles que desejavam conhecer a verdadeira fé me procuravam e queriam aprender comigo - eu, que ainda estava apenas no início! Pela minha parte, por natureza algo tímido, sempre preferi o sossego e permanecer discreto, de modo que comecei a procurar um pequeno refúgio que me permitisse recolher dos Homens. Mas, pelo
contrário, todos os meus refúgios se tornavam em escolas públicas. Em resumo, apesar de eu sempre ter pretendido viver incógnito, Deus guiou-me por tais caminhos, onde não encontrei sossego, até que ele me puxou para a luz forte,
contrariando o meu caráter, e como se costuma dizer, me colocou em jogo. E, na verdade, deixei a França e dirigi-me para a Alemanha para que ali pudesse viver em local desconhecido, incógnito, como sempre tinha desejado."

Note-se que a França e Alemanha não existiam no sentido de hoje mas sim em termos de zonas de língua francófona ou alemã. Entretanto, o papa Clemente VII pressionava o rei de França a reprimir os protestantes franceses. Em bulas de 30 de Agosto de 1533 e de 10 de Novembro do mesmo ano, o papa exortava à "aniquilação da heresia Luterana e de outras seitas que ganham influência neste reino". Os dois encontram-se, então, nesse mesmo ano, em Marselha, onde discutem entre outras coisas a "guerra contra os turcos, lá fora, e a repressão das heresias cá dentro".
Em 1534, Calvino escreve o seu segundo livro, que será também o primeiro sobre religião. Chamar-se-á Psychopannychia" e é relativamente pouco conhecido, em comparação com as outras obras de Calvino. Calvino faz uma crítica severa aos anabaptistas, que acusa de serem uma seita tresmalhada. O livro coloca questões teológicas, mais do que oferecer respostas. Calvino, nos seus 24 anos de idade, está em processo de busca. Defende a imortalidade da alma. O título completo era: "Psychopannychia - tratado pelo qual se prova que as almas permanecem vigilantes e vivas uma vez que tenham deixado os corpos, o que contraria o erro de alguns ignorantes que sustentam que elas dormem até ao último momento" - o que é, também, um ataque aos anabaptistas. Apesar de escrito em 1534, o livro
seria apenas publicado em 1542.

Genebra nos dias de hoje, uma das cidades mais ricas do mundo 1536 é também o ano da chegada de Calvino a Genebra. Calvino tem nessa altura 26 anos. Após a estadia em Ferrara, na Primavera de 1536, Calvino tinha estado em Paris, aproveitando-se de um período de relativa calma na perseguição aos protestantes. Tratou de assuntos pessoais e da família. Em junho faz em Paris uma procuração em nome do seu irmão. Em Julho de 1536, João Calvino, pretendendo dirigir-se a Estrasburgo, inicia a viagem, juntamente com o irmão Antoine e a irmã Marie. Em vez de tomar o caminho mais curto, Calvino faz um desvio pelo sul, evitando a área onde a guerra entre as forças de Francisco I e Carlos V são uma ameaça. Por coincidência, Calvino chega a Genebra, onde permaneceu, apesar de ter inicialmente pretendido continuar viagem, o que foi vivamente desaconselhado pelo reformador Guillaume Farel (na altura de 47 anos de idade). O caminho para Estrasburgo encontrava-se inseguro por causa da guerra. A Genebra que Calvino
encontra vive ainda a agitação dos conflitos entre Mamelucos e Confederados. João Calvino já tinha viajado até Estrasburgo durante as guerras otomanas, e passado através dos cantões da Suíça. A quando da sua estadia em Genebra, Guillaume Farel pediu ajuda a Calvino na sua causa pela igreja. Calvino escreveu sobre este pedido: "senti como se Deus no céu tivesse colocado a sua poderosa mão sobre mim para barrar-me o caminho"". 18 meses depois, as mudanças de Calvino e Farel levariam à expulsão de ambos.

A saída atribulada de Genebra

A 16 de Janeiro de 1537, as autoridades da cidade de Genebra aprovam o documento escrito pelo líder protestante Farell, que se destina a servir de confissão de fé e orientação para todos os habitantes de Genebra. Calvino faz também algumas sugestões, parte das quais são rejeitadas. Cerca de vinte artigos dispõem, entre outras coisas, que os idolatras, querulantes, assassinos, ladrões, bêbados (entre outros) sejam futuramente excomungados. As lojas devem fechar ao domingo, assim que soem os sinos da missa. Estas disposições, apesar de aceites pelas
autoridades vão criar atritos com Farell e Calvino. O estigma da excomunhão é extremamente discriminador e destruidor de relações sociais no século XVI. Em Março, os líderes anabaptistas de origem holandesa Hermann de Gerbihan e Benoît d'Anglen são expulsos de Genebra, juntamente com os seus seguidores. Em Abril de 1537, por sugestão de Calvino, é constituido um "syndic" (síndico) que tem por objectivo ir de casa em casa e inquirir sobre a confissão dos moradores. A ação é contestada. Alguns moradores recusam-se a pronunciar-se sobre a sua fé. Em
junho de 1537 as autoridades de Genebra decidem que o Domingo é o único dia feriado. Futuramente nenhum outro feriado será considerado. 30 de Outubro é definido como o prazo para todos os moradores de Genebra se pronunciarem quanto à sua religião. Aqueles que não reconhecem os decretos de Farell são obrigados a deixar a cidade em 12 de Novembro. Após esta data, a situação complica-se para Farell e Calvino. Particularmente provocante é o fato de um estrangeiro (francês), como Calvino, decidir sobre a excomunhão e expulsão de habitantes naturais de Genebra. As autoridades, perante estes protestos, passam a ser mais críticas para com os líderes protestantes. A 3 de Fevereiro de 1538 são eleitos para as autoridades da cidade de Genebra 4 pessoas que são inimigos de Calvino e dos protestantes. Em Março, estas novas autoridades proíbem Calvino e Farell de se pronunciarem sobre assuntos não religiosos.

FALECIMENTO

Nos seus últimos anos de vida, a saúde de Calvino começou a vacilar. Sofrendo de enxaquecas, hemorragia pulmonar, gota e pedras nos rins foi, por vezes, levado carregado para o púlpito. Calvino continuava a ter detractores declarados que lhe dirigiam ameaças constantes. Entretanto, apreciava passar os seus tempos livres no lago de Genebra, lendo as
escrituras e bebendo vinho tinto. No final de sua vida disse a seus amigos que estavam preocupados com o seu regime diário de trabalho: "Qual quê? Querem que o senhor me encontre ocioso quando ele chegar?" João Calvino faleceu em Genebra a 27 de Maio de 1564. Foi enterrado numa sepultura simples e não marcada, conforme o seu próprio pedido.